Ksenia Nekrássova/ Ксения Некрасова (13)





A vida de Ksenia Nekrássova é repleta de mistérios. A começar pelo ano de seu nascimento. Crê-se que seja 18 de janeiro de 1912, embora haja, nos arquivos, outras datas. Foi gerada fora do casamento, viveu em orfanato até ser retirada de lá para ser criada pela família de um professor seu. Nasceu em Altynai, um vilarejo no oblast de Sverdlovsk.

Quando mudou-se para Moscou, em 1931, não havia terminado os estudos, na faculdade de pedagogia, devido a problemas de saúde. Após obter formação universitária, Ksenia foi trabalhar no departamento cultural de uma usina de metal pesado, na região dos Urais. Foi enviada, outra vez, a Moscou, desta vez  por ordem do comitê regional da União da Juventude Socialista (Komsomol).  Entre 1937 e 1941, estudou no Instituto de Literatura Maksim Górki, mas não concluiu os estudos por causa da Segunda Guerra Mundial.

Em 1937, foi publicada uma seleção de poemas de Ksenia Nekrássova, com prefácio de Nicolai Asseiev, um dos mais importantes poetas soviéticos da época. Em 1943, Ksenia recebeu um fervoroso endosso de ninguém menos que Anna Akhmátova: “Em toda minha vida só me encontrei com duas poetas mulheres. Marina Tsvetaeva e Ksenia Nekrássova”. 

Mesmo com uma carta de recomendação de Akhmátova, Nekrássova não foi aceita pela União dos Escritores. Viveu com dificuldades. Foi acudida pelos amigos em necessidades básicas como vestir, comer e morar. Certa vez, ao queimar a lenha para o fogão, o artista plástico Robert Falk leu o poema “Da infância”, de Ksenia Nekrássova, que traduzimos abaixo. Ele ficou tão admirado com o que viu, que procurou conhecê-la. O casal Falk passou a receber a poeta em casa e a ajudá-la. É de Falk o retrato que ilustra esta coluna. 

Em vida, Ksenia Nekrássova publicou duas coletâneas de poemas. Morreu em 1958,  oito dias após receber um apartamento do governo, aos 46 anos. 



Da infância


Eu acariciava o céu no riozinho E em um novo varal de piaçava Pendurava o céu para secar. E depois, de um casaco de peles de ovelha, que era das costas do pai, nós nos vestíamos e sentávamos numa carroça e com o arado nós partíamos pra semear o campo. Uma das pernas pendida da carroça misturava o ar, tal como creme de leite, e os olhares de alguém, aboticados, na brecha da carroça, e sobre os eixos, rodas, como os olhos de um galo, rodopiavam. Porém, bem no meio da carroça, eu, como num conto de fadas de madeira, me sentava.

***

Я полоскала небо в речке

и на новой лыковой веревке

развесила небо сушиться.

А потом мы овечьи шубы

с отцовской спины надели

и сели

в телегу

и с плугом

поехали в поле сеять.

Один ноги свесил с телеги

и взбалтывал воздух, как сливки,

а глаза другого глазели

в тележьи щели,

а колеса на оси,

как петушьи очи, вертелись.

Ну, а я посреди телеги,

как в деревянной сказке сидела.


***


Publicado na edição de 27 de agosto de 2022 do jornal A União.

Tradução refeita em 23 de agosto de 2023.

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