Igor Sievieriânin/ Игорь Северянин


O Futurismo russo se apresentou de modo diversificado. Uma das primeiras pessoas a usar o termo na Rússia foi o poeta Igor Sievieriânin que fundou, em 1911, o Ego-Futurismo. Logo depois seria fundado o Cubo-futurismo, sob a liderança dos poetas Velimir Khlébnikov e  David Burliuk, que foi responsável por incorporar, anos depois, Vladimir Maiakovski ao grupo.  As duas facções se encontraram e excursionaram para Odessa, na Ucrânia, em 1913. 

Igor Sievieriânin, cinco anos mais velho que Maiakovski, manteve com ele uma relação de amizade e rivalidade que inspirou a ambos. Um dos grandes poemas de Maiakovski, da fase pré -revolucionária, é certamente A nuvem de calças. A abertura da primeira parte ( “Acha que é a malária que em mim delira?// Aquilo foi,/ foi em Odessa”)  inspirada num poema de Severianin, conforme atesta o testemunho de Vassíli Kamiênski, um dos fundadores do cubo-futurismo. No trem, enquanto compunha o poema, Maiakovski recitava o primeiro verso de “Poema-mignonette”, de Severianin, que traduzi abaixo:


Aquilo foi no mar Poema-mignonette Aquilo foi no mar onde há espuma em lã, Onde é difícil ver uma urbana equipagem... Na torre uma rainha a interpretar Chopin E escutando Chopin, caiu de amor o pajem Foi tudo muito simples, tudo foi tão lindo: Ela pediu pra vir uma romã cortada, E dando-lhe a metade, e o pajem exaurindo, E caiu ela de amor, em tema de sonata. Porém depois rendeu-se, rendeu-se em trovoada, Dormia a ama até raiar a criadagem... Aquilo foi no mar onde é azulada a onda, E a espuma é em lã e há sonata e pajem. < 1910 >


1910


Mas Maiakovski também foi responsável por inspirar o amigo-rival, Igor Sievieriânin. Após uma apresentação, estavam juntos bebendo quando Maiakovski colocou pedaços de uma fruta em sua taça de champagne e gostou tanto da mistura que instou o amigo a acompanhá-lo: “Igor Vasilyevich, prove,  abacaxi no champagne, é uma delícia estonteante”. Naquele momento, Igor Sievieriânin improvisou a primeira estrofe de um de seus mais famosos poemas, que vos apresento em tradução minha: 


Overture


Abacaxi no champagne! Abacaxi no champagne! espumante e flamejante, é uma delícia plena! Tenho algo da Noruega! Eu tenho algo da Espanha! Eu me inspiro num impulso! E vou segurando a pena! Aeroplanos zumbindo! Apostem corrida, carros! Expressos helicessilvem! Aqui alguém leva açoite! Asadecolem veleiros! Lá um outro foi beijado Abacaxi no champagne - este é o impulso da noite! Seja com moças aos nervos ou altas damas que estranhem, A vida é farsiquimera mas de uma tragédia parte. Abacaxi no champagne! Abacaxi no champagne! De Moscou pra Nagasaki! De Nova Iorque até Marte! 1915




Em 1918, quando a revolução de Outubro triunfou e Maiakovski era a voz poética do novo regime, houve um concurso para se escolher o Rei dos Poetas. Sievieriânin, que ao contrário do colega não queria doutrinar ninguém, hipnotizou a plateia e os demais colegas com sua declamação musical. Maiakovski não gostou de ter perdido. Os dois só viriam a se reconciliar em 1921, quando Maiakovski excursionou por Berlim.  

Após a prestigiosa eleição, Igor Sievieriânin, que estava no auge de sua carreira, emigrou para Estônia e morreu lá, em 1941, sem nunca mais experimentar a fama e a glória pretéritas. 


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Publicado na edição de 8 de outubro de 2022 do jornal A União


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