Óssip Mandelstam/ Осип Мандельштам (4)


Rua Mandelstam


Localizada próximo à fronteira com a Ucrânia, a cidade de Voronej foi escolhida por Óssip Mandelstam (1891-1938) para cumprimento de sua pena de exílio. O poeta foi condenado por atividades anti-soviéticas, em 1934. Naquele ano, Mandelstam havia declamado a várias pessoas um poema violento contra o líder máximo da União Soviética, Josef Stalin. 

Do período em que viveu na cidade (1934-1937), Mandelstam compôs um conjunto significativo de poemas que foram posteriormente organizados sob o título de Cadernos de Voronej.  A crítica literária é unânime em falar que Mandelstam não amava a cidade na qual ficou desterrado. Das amizades que fez, a maioria foi com músicos, quando nenhum contato com os escritores locais foi realizado. 

No seu poema “Rua Mandelstam” ficava claro para mim seu desprezo pelo lugar em que havia sido confinado ao se referir à localidade como  “яма” (yama), que pode ser traduzido como “buraco”. Esta palavra funcionou como uma espécie de guia para minha tradução. Tentei, portanto, imprimir o tom de ofensa por se estar vivendo no fim do mundo que me parecia estar no texto original. Eis a primeira versão. 

 

Rua Mandelstam 


Que rua que é esta aqui? 

É a rua Mandelstam. 

Qual a desse sobrenome

Tinhoso e tão sem desdobro

Soa torto, reto não. 


Nela havia poucas linhas 

Lírio em seu gênio nem tinha, 

E por isso que esta rua 

Ou, melhor buraco, chamam 

Assim mesmo pelo nome 

Deste tal de Mandelstam... 


No final do ano passado, peguei um trem e fui até Voronej. Havia, no museu literário da cidade, uma exposição dedicada a Mandelstam. A expositora explicou que “Rua Mandelstam” fazia referência ao primeiro endereço do poeta na cidade. “A rua é do jeito que ele cita no poema, bem íngreme”, informou. 

Ao chegar no local, tive a impressão de que a casa em que Mandelstam morou, simplesmente, parecia cair num fosso, tal era a irregularidade do terreno. Não se tratava de simbolismo; o “buraco” era descrição acurada daquela geografia difícil, que o poeta comparou a seu próprio caráter. 

Com esta nova percepção, revisei minha a tradução feita e cujo resultado compartilho neste artigo:

 

 Rua Mandelstam 


Que rua é esta daqui?

É a rua Mandelstam.

Que diabos de sobrenome  

Como ela não vira o avesso,

Soa truncado e não reto


Nele o linear foi pouco

De candura não foi poço,

Por isto a rua em questão

Ou, na verdade, este fosso,

Pelo nome, assim, se chama

Deste tal de Mandelstam…

1935


Улица Мандельштама


Это какая улица?

Улица Мандельштама.

Что за фамилия чертова —

Как ее ни вывертывай,

Криво звучит, а не прямо.


Мало в нем было линейного,

Нрава он был не лилейного,

И потому эта улица,

Или, верней, эта яма

Так и зовется по имени

Этого Мандельштама…


***

Publicado na edição de 21 de maio de 2021 do jornal A União.


Dezembro de 2021. Astier Basílio, na rua onde morou Óssip Mandelstam, em Voronej.

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