Ievguêni Ievtuchenko/ Евгений Евтушенко(10)
Se vivo estivesse, segunda-feira passada, o poeta Ievguêni Ievtuchenko faria 90 anos. Morreu em 2017, nos Estados Unidos, onde vivia desde 1991, quando aconteceu o colapso da União Soviética.
Nenhum poeta russo, nem mesmo Pushkin, obteve tanta glória e aclamação em vida como Ievtuchenko. Levou multidões a estádios, visitou mais de 90 países, foi nomeado ao prêmio Nobel de Literatura, em 1963. Em plena ditadura de Salazar, esteve em Portugal, em 1967. Foi recebido com honras no Palácio do Planalto, pelo então presidente do Brasil, José Sarney, em 1987. Antes, fora recepcionado pelo presidente Nixon, na Casa Branca.
Mas nem tudo são flores. Por sua presença espalhafatosa era maldosamente chamado nos anos 1960 de “a Rita Pavone da poesia”. Um dos mais importantes poetas do século XX, Joseph Brodsky, detestava-o: "Ievtuchenko? Olha, não é tão simples assim. Claro que ele é um poeta muito ruim. E pior ainda como pessoa. É uma tamanha fábrica de reprodução de si mesmo... Ele tem poemas dos quais, em geral, é possível se lembrar, amar, dá para gostar deles. Eu simplesmente não gosto do nível da coisa toda".
Poeta contemporâneo que goza de relativo prestígio na Rússia hoje, Dmitri Bykov escreveu em seu instagram a importância de Ievtuchenko como recuperador das baladas, bem como elogiou sua inventividade no trato com as rimas. A principal emissora de televisão russo, o Canal 1, reprisou um documentário "Diálogo com Ievtuchenko", filme em três episódios.
Foi traduzido em Portugal por J. Seabra Dinis e Fernando Assis Pacheco. No Brasil, integrou a antologia da Poesia russa moderna, dos irmãos Campos e Boris Schnaiderman. Abaixo segue uma tradução nossa.
Eu temo não saber lidar com o rosto
quando eu for ver-te, não sei onde, e do
fim que pelo visto já está disposto
e no qual não existe mais segredo
Eu temo não saber lidar com a alma,
Eu temo não saber lidar com o corpo
e que sobre mim e sobre ti um trauma
não violente nós dois com o mundo todo.
Eu temo - e nem sei dizer o quê -
a ti, como a secreta riqueza disso.
Eu temo - mais do que tudo - é
que este medo que eu tenho dê sumiço.
2004
Боюсь не справиться с лицом,
когда тебя увижу где-то,
и завершится всё концом,
в котором больше нет секрета.
Боюсь не справиться с душой,
боюсь не справиться и телом,
чтоб над тобой и надо мной
не надругались миром целым.
Боюсь – не знаю от чего –
тебя, как тайного богатства.
боюсь – и более всего –
его пропажи не бояться
2004 г.
***
Publicado na edição de 23 de julho de 2022 do jornal A União
Tradução revisada em 29 de fevereiro de 2024.
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