Artiom Skvortsóv/Артём Скворцов
Fazia tempo que eu queria escrever um poema que desse conta da nossa passagem aqui na terra. Da entrada e saída em cena. Do trabalho coletivo que é viver. Não consegui encontrar a metáfora adequada, mas ao traduzir este poema abaixo, me deparei com a ideia que há muito perseguia, mas não conseguia alcançar.
Improvisação
Certa vez
eu fui a um jazz club,
nem tinha começado
a jam-session.
Standards era o que soava por lá.
O público não era muito, nem pouco
e os músicos
em número suficiente.
Era evidente que o pessoal tocava há tempos,
mas não dava pra sentir cansaço.
Apesar disso,
de vez em quando
um deles descia até o salão
e seu lugar era ocupado por outro.
Dando uma olhada e escutando
eu também fiquei aceso
e, pegando o instrumento
da mão da vez,
eu fiz o meu,
mas depois eu o entreguei ao
que vinha em seguida
e sai de cena.
No pouco tempo que fiquei por lá
a composição dos músicos
foi renovada completamente,
a harmonia e os arranjos
transfiguravam-se
e algumas vezes foram mudados
a tonalidade e o tempo.
Mas o tema
foi sempre aquele mesmo
e era tal
o poder da sua pressão.
Eu fiquei um pouco mais,
saudei os músicos
com uma taça meio vazia,
e fui,
sem esperar pelo fim.
***
Импровизация
Как-то раз
я зашёл в джаз-клуб,
не застав начала
джем-сешна.
Там звучал стандарт.
Публики было ни много, ни мало,
а музыкантов столько,
сколько нужно.
Очевидно, ребята играли давно,
но усталости не чувствовалось.
Тем не менее,
время от времени
один из них спускался в зал,
а его место занимал другой.
Поглядев и послушав,
я тоже загорелся,
и, подхватив инструмент из очередных рук,
отработал своё,
а затем передал его идущему следом
и покинул сцену.
За недолгое время, что я там пробыл,
состав игроков полностью обновился,
преобразились гармония и аранжировка,
и несколько раз менялись тональность и темп.
Но тема
была всё та же,
и столь же мощен
был её напор.
Я посидел ещё немного,
отсалютовал музыкантам
полупустым бокалом
и ушёл,
не дождавшись конца.
O autor do poema é Artiom Skvortsóv. Ele tem 49 anos. É poeta, crítico literário, doutor em literatura e professor da Universidade de Kazan, onde nasceu e vive. Conheci-o em setembro do ano passado, Festival Voloshin de Literatura, realizado em Kaliningrado.
Na área acadêmica, Artiom Skvortsóv publicou trabalhos sobre a poesia de Vladislav Khodassiévitch, além de atuar como editor de coletâneas de poesia. Foi publicado pelas principais revistas literárias russas a exemplo da Oktyabr, Ural, Novy Mir, etc.
No poema abaixo, Artiom Skvortsóv dialoga com o poeta Denis Novikov (1967-2004), um dos que mais sofreu com a perda do prestígio da poesia na Rússia pós-soviética. Em seu poema “Chukókkala”, Denis Novikov relata o abandono de uma boneca deixada numa lata de lixo de um prédio. Artiom Skvortsov, por sua vez, mesmo diante da realidade devastadora que descarta a arte, ainda assim, continua apostando na literatura.
Velho baú
Era um velho baú na entrada principal,
de um edifício antigo, todo ele pura escama,
pintura descascando, camada em camada
a olhar com sua tranca enferrujada e aberta
Era um velho baú, comum a todos há tempos,
nele antes utensílios moradores punham
e coisas que embebiam o ar de naftalina
e nos anos difíceis cenoura e batatas.
Era um velho baú, local para os encontros
de ratos, a roer estoques, e de gatos
pegadores de ratos e de desabrigados
casais publicadores de gemido à noite
Era um velho baú, estava vazio, até
eu por nele uma pilha de livros didáticos,
tirados de um monturo, eles eram de língua
e de literatura - vai que, de repente.
Publicado na edição de 24 de fevereiro de 2024 do jornal A União
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