Anna Truchkina /Анна Трушкина (1)


Ao subir do palco, Anna Trushkina usava um vestido azul que realçava mais ainda a cor de seus olhos. Trazia na mão uma folha, onde estava escrito seus poemas. Diante de mim era a primeira vez que eu tinha a chance de ver um autor dar voz às palavras que ele próprio havia criado. Até então, meu contato com a poesia russa sempre havia sido de modo indireto. Interpretações de atores. Gravações das vozes de poetas mortos. 

Mas diante de mim a poesia estava viva e brandia retumbante na voz de Anna que soou firme e branda. À medida em que escutava, sentia-me guiado por aquele universo de música, ritmo e de metáforas. E uma delas me arrebatou: “Na escuridão a dois mergulhávamos juntos”. Foi naquele momento que decidi traduzir o poema. 

A apresentação de Anna fez parte de um sarau que foi apresentado num dos mais charmosos endereços de Moscou: a rua Nova Arbat.  Em seu começo é possível avistar, sem muita dificuldade, a Praça Vermelha, a Biblioteca de Lênin e a Catedral do Cristo Salvador.  E lá, no número 8, ocupando um quarteirão inteiro que fica a livraria Dom Knigi, em cujo auditório acontece periodicamente o “Chitayem vmeste” (“Leiamos juntos”) um encontro no qual se reúnem atores e poetas e que na edição de março contou com a presença de Anna Trushkina. 

Natural da cidade de Irkutsk , na região da Sibéria, Anna mora há mais de 20 anos em Moscou. Inédita em livro, já publicou numa das mais prestigiosas publicações literárias da Rússia, a revista “Novy Mir” onde, por exemplo, Soljenitsin publicou sua novela “Um Dia na Vida de Ivan Denisovich”, em 1962

Compartilho minha tradução, com o original, em russo (*)

Mas eu caí no verão como um rio

no céu-coberta afogou-se a mão

os cúmulos vão dando suspiros

e corriam do topo sem sons


E, como sempre, ao pensar em ti

choveu, brusco, na calha de estanho

enchendo de rouxinóis o junho e 

todas as petúnias foi molhando


Quartos que eram lagoas sem sóis

repletos de um real em desleixo.

Nadávamos na escuridão a sós

a lembrar raros e alegres peixes


Nadávamos a sós pela calada 

a lembrar peixes, alegres, longos

Estás aqui, não no arco da água 

a se afastar do sonolento âmago.  


***

А я впадала в лето, как река,

рука тонула в небе-одеяле,

и вздохов кучевые облака

по потолку беззвучно пробегали.


И как всегда при мысли о тебе

внезапный дождь по жестяной трубе

забил, залился соловьём в июне,

и увлажнились лепестки петуний.


А комнаты прохладный водоём

был полон ускользающих реалий.

Мы плыли в темноте с тобой вдвоём,

счастливых редких рыб напоминали.


С тобой вдвоём мы плыли в немоте,

напоминая рыб, счастливых, длинных.

Ты здесь - и нет тебя, окружность по воде

расходится от сонной сердцевины.


***


Publicado em 30 de abril de 2022 no jornal A União

(*) Segunda versão desta tradução, publicada também no jornal A União em 16 de dezembro de 2023

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